terça-feira, 2 de agosto de 2016

Português III – Aula 01 - Resumo: Mecanismos de articulação entre orações: coordenação e subordinação – visão tradicional e visão contemporânea

Edila Vianna da Silva

1) Coordenação e Subordinação: Introdução analógica

Segundo a Norma Gramatical Brasileira (NGB), os princípios organizadores da frase portuguesa são a coordenação e a subordinação.

Observe:

1. [Cheguei da escola] [e almocei logo]. (Independência Sintática e Dependência Semântica)
2. [Almocei logo] [porque estava com muita fome]. (Dependência Sintática da frase 2 em relação à frase 1)

Na primeira frase cada oração apresenta estrutura sintática completa, isto é, a presença de uma independe da presença da outra do ponto de vista sintático: cada uma delas contém os termos necessários para transmitir sua mensagem, caracterizando o processo de COORDENAÇÃO. Claro está que, entre elas, há uma dependência de natureza semântica, de sentido, ou não estariam no mesmo período.
Na frase (2), a primeira oração (“almocei logo”) é a base, e a outra (“porque estava com muita fome”) serve de termo adjacente à primeira, é função sintática do verbo da primeira, pois expressa a causa do fato de “almoçar logo”, caracterizando o processo de SUBORDINAÇÃO.


2) Subordinação: Características Básicas

  • Segundo Duarte (2007, p. 205), “a subordinação é uma forma de organização sintática segundo a qual um termo exerce função no outro”.
  • Estar subordinado significa ser dependente sintaticamente.
  • Pode estar presente entre constituintes de oração ou entre orações, formando sintagmas.
  • Orações subordinadas são as que funcionam como membros, termos de outra oração.

Exemplos:

1. Ela descobriu [que os sites de aluguel de apartamentos são fontes de inspiração] para decorar a casa. (função de objeto direto)
2. Basta [escolher a opção] e a foto aparece. (função de sujeito)


3) Coordenação: Características Básicas

  • Mecanismo por meio do qual elementos do mesmo nível* associam-se, formando uma sequência.
  • São independentes sintaticamente uns dos outros.

* Dizemos que elementos, palavras ou orações são do mesmo nível quando apresentam identidade funcional e pertencem à mesma classe de palavra. Assim, coordenam-se termos com valor de substantivo, adjetivo etc. que tenham a mesma função sintática. Por exemplo, na frase “A farmácia não fecha; de dia ou de madrugada, há sempre um funcionário a postos”, as duas locuções destacadas estão coordenadas pela conjunção ou, – e formam, portanto, uma sequência –, uma vez que ambas equivalem a advérbios e funcionam como adjuntos adverbiais de tempo.


4) Plano das Palavras e Plano da Oração

Plano das Palavras: Em, por exemplo, sapatos novos e bonitos, os adjetivos “novos” e “bonitos” desempenham o mesmo papel em relação a “sapatos”. Se, então, exercem igual função, são coordenados um ao outro e subordinados ao substantivo “sapatos”.

Plano da Oração: Cada oração coordenada tem seus próprios termos e, assim, não apresenta constituinte expresso por outra oração. Vejamos os exemplos:

1. [Às vezes, paravam o trabalho], [enxugavam o suor do rosto] [e falavam alguma coisa tola].
2. [Esperamos] [que vocês aprendam os processos] [e (que) escrevam melhor].

No período 1, há três orações, todas com sua estrutura completa, portanto, independentes do ponto de vista sintático e, assim, coordenadas.
No período 2, as orações 2 e 3 estão subordinadas à oração 1 e nela exercem a mesma função: são núcleos do objeto direto da forma verbal “esperamos”. Vejam, elas – as coordenadas – não são função uma da outra, mas da oração 1. Estão, portanto, coordenadas entre si e subordinadas à oração 1.


QUADRO RESUMIDO DA DIFERENCIAÇÃO:

Coordenação
Subordinação
Associa elementos de mesma função       
Cria funções
Forma sequências
Forma sintagmas
Orações coordenadas
Orações subordinadas
Independentes sintaticamente
Dependentes sintaticamente
Estrutura sintática completa
São termos de outra oração



5) Abordagem Tradicional e outras posições sobre os Mecanismos de Articulação das Orações

Os gramáticos mais tradicionais seguem estritamente a NGB, que embora tenha sido elaborada em termos de “recomendação” ao ensino escolar, é vista pela maioria dos professores e estudiosos do Português como uma verdadeira lei.

Norma Gramatical Brasileira
Com a finalidade de uniformizar e simplificar os termos usados na descrição dos fatos gramaticais do Português do Brasil, a Nomenclatura Gramatical Brasileira – NGB – resultou do trabalho de uma Comissão formada por especialistas, tais como Celso Cunha e Rocha Lima, entre outros. Implantada por portaria do Ministro da Educação em 1959, teve seu uso recomendado “no ensino programático da Língua Portuguesa e nas atividades que visem à verificação do aprendizado, nos estabelecimentos de ensino”.

a) Segundo Cunha e Cintra:

Para Cunha e Cintra (1985, p. 578-579), que seguem a NGB, no período composto por coordenação, as orações:
a) são autônomas, INDEPENDENTES, isto é, cada uma tem sentido próprio;
b) não funcionam como TERMOS de outra oração, nem a eles se referem: apenas, uma pode enriquecer com o seu sentido a totalidade da outra.
E conclui: “A tais orações autônomas dá-se o nome de COORDENADAS e o período por elas formado diz-se COMPOSTO POR COORDENAÇÃO.”
Quanto ao período composto por subordinação, os autores assim se expressam:
As orações sem autonomia gramatical, isto é, as orações que funcionam como termos essenciais, integrantes ou acessórios de outra oração, chamam-se SUBORDINADAS. O período constituído de orações SUBORDINADAS e uma oração PRINCIPAL denomina-se COMPOSTO POR SUBORDINAÇÃO.


b) Segundo Bechara:

Na Moderna gramática portuguesa (1999), em edição mais atualizada “no plano teórico da descrição do idioma”, de acordo com seu autor, Evanildo Bechara utiliza o conceito de oração complexa para denominar o chamado período composto por subordinação, da visão tradicional. Em clara explicação, o gramático manifesta seu ponto de vista:
Uma oração independente do ponto de vista sintático como A noite chegou (...) pode, pelo fenômeno de estruturação das camadas gramaticais conhecido por hipotaxe ou subordinação, passar a uma camada inferior e aí funcionar como pertença, como membro sintático de outra unidade;
O caçador percebeu que a noite chegou.

(...) Dizemos, então, que a unidade sintática que a noite chegou é uma oração subordinada. A gramática tradicional chama à unidade O caçador percebeu oração principal. Gramaticalmente, a unidade oracional O caçador percebeu que a noite chegou é uma unidade sintática igual a O caçador percebeu a chegada da noite, onde a chegada da noite integra indissoluvelmente a relação predicativa que tem por núcleo e verbo percebeu, na função de complemento ou objeto direto (1999, p. 462).

E conclui o gramático:
A rigor, o conjunto complexo que a noite chegou não passa de um termo sintático na ORAÇÃO COMPLEXA O caçador percebeu que a noite chegou, que funciona como objeto direto do núcleo verbal percebeu (1999, p. 463).
No que respeita ao mecanismo da coordenação, que também denomina-se de parataxe, Bechara, da mesma forma que os outros gra­máticos, considera coordenadas
as orações sintaticamente independentes, que, por isso, poderiam aparecer em separado:
O caçador chegou à cidade e procurou um hotel.
ou
O caçador chegou à cidade. Procurou um hotel.
De acordo com o autor, é somente neste caso, na presença de um grupo de orações da mesma camada gramatical, isto é, orações coordenadas, que podemos falar em orações compostas, grupos oracionais ou períodos compostos.

c) Segundo Azeredo:

Azeredo (2001), ao discorrer sobre os processos sintáticos, observa que palavras, sintagmas, orações associam-se no discurso em virtude de variadas relações semânticas, ora intuídas pelos participantes da situação discursiva, ora explicitadas por diferentes meios de coesão textual, entre os quais, os pronomes, conectores, a concordância. Por exemplo, sabemos que na oração “Feri-me com a faca”, a ação expressa pelo verbo refere-se a um ser, “eu”, ou de outra forma, o sujeito da oração é de primeira pessoa, porque o mecanismo da concordância verbo-sujeito faz com que a forma “feri” ocorra na primeira pessoa, indicando, assim, a subordinação entre os termos sujeito e predicado.

Daí se infere que “o processo sintático por excelência é a subordinação, meio que consiste em prover de função as unidades que constituem os sintagmas e os sintagmas que constituem as orações” (2001, p. 48-49). Na estruturação sintática – por subordinação – uma unidade da categoria X posiciona-se sob o domínio de uma unidade da categoria Y, como na relação verbo e objeto direto, em que o objeto é o complemento do verbo, está sob o domínio do verbo.

De modo nítido, o autor demonstra que a subordinação é um processo intra-oracional, ao passo que a coordenação se dá em todos os níveis, uma vez que associa palavras, sintagmas, orações, que tenham a mesma natureza. Para Azeredo – aí uma importante reflexão para os estudos que começamos –, a coordenação é um mecanismo antes discursivo que sintático, pois desconhece os limites da oração; para ele coordenam-se até parágrafos. Para distinguir da associação discursiva que vai além da oração, chamada de associação lato sensu, denomina a associação discursiva que ocorre no âmbito da oração de associação discursiva stricto sensu (2001, p. 116).


d) Segundo Castilho:

Castilho (2002, p. 131-132) considera desnecessário o emprego do termo período e o substitui pela expressão sentença complexa quando duas ou mais sentenças funcionam como constituintes de uma unidade maior, seja pela coordenação ou subordinação desses constituintes.
O autor estabelece os seguintes tipos de relação intersentencial na constituição das sentenças complexas (SC):

* SC estruturadas por JUSTAPOSIÇÃO – uma sentença se põe ao lado da outra, sem qualquer nexo conjuncional, como em Não fui à festa; ninguém me convidou.

* SC estruturadas por COORDENAÇÃO – uma sentença se põe ao lado da outra por meio de nexos conjuncionais, como em Viajei e esqueci o trabalho.

* SC estruturadas por ENCAIXAMENTO – uma sentença é constituinte de outra, isto é, argumento de outra, como em Ela disse [que viria à entrega dos prêmios]. (A sentença entre colchetes é argumento da forma verbal “disse”).

* SC estruturadas SEM ENCAIXAMENTO – uma sentença estabelece uma relação de adjunção com outra, quer dizer, está ligada a um termo de outra, mas não é seu argumento como em Voltaremos à atividade [depois que a greve acabar]. (A sentença entre colchetes está ligada à forma verbal “voltaremos”, na função de seu adjunto.)


* SC estruturadas por CORRELAÇÃO ou PARADEPENDÊNCIA - uma sentença estabelece uma relação de interdependência com outra, como em Estudou tanto que ficou com dor de cabeça.

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